Em testes feitos em ratos, pesquisadores da USP e da Unifesp observam que implantes contendo hidróxidos duplos lamelares não induzem inflamação e ainda aceleram o processo de cicatrização. Na imagem, as setas indicam o local onde foram implantados os HDLs feitos com magnésio (esquerda) e zinco (direita) (imagem: Scientific Reports)

Nanopartícula inorgânica mostra potencial para ser usada como carreador de fármaco
13 de fevereiro de 2017

Em testes feitos em ratos, pesquisadores da USP e da Unifesp observam que implantes contendo hidróxidos duplos lamelares não induzem inflamação e ainda aceleram o processo de cicatrização

Nanopartícula inorgânica mostra potencial para ser usada como carreador de fármaco

Em testes feitos em ratos, pesquisadores da USP e da Unifesp observam que implantes contendo hidróxidos duplos lamelares não induzem inflamação e ainda aceleram o processo de cicatrização

13 de fevereiro de 2017

Em testes feitos em ratos, pesquisadores da USP e da Unifesp observam que implantes contendo hidróxidos duplos lamelares não induzem inflamação e ainda aceleram o processo de cicatrização. Na imagem, as setas indicam o local onde foram implantados os HDLs feitos com magnésio (esquerda) e zinco (direita) (imagem: Scientific Reports)

 

Karina Toledo  |  Agência FAPESP – Os hidróxidos duplos lamelares (HDLs) são nanopartículas inorgânicas formadas por camadas sobrepostas de elementos como magnésio, ferro e alumínio. Estudos recentes têm sugerido que esse tipo de material, também conhecido como argila aniônica ou composto do tipo hidrotalcita, pode ser usado como carreador de fármacos.

Com apoio da FAPESP, pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) e da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) testaram em ratos a biocompatibilidade de implantes contendo HDL. Análises feitas ao longo dos 30 dias seguintes ao procedimento cirúrgico mostraram que, além de não induzir inflamação, as nanopartículas inorgânicas aceleraram o processo de cicatrização do tecido.

Os resultados da pesquisa, feita durante o pós-doutorado de Vanessa Roberta Rodrigues da Cunha, foram divulgados na revista Scientific Reports.

“A maioria dos testes de toxicidade com esse tipo de material inorgânico é feita em culturas de células. Nós optamos por fazer o teste in vivo pensando em uma futura aplicação em humanos. Seria interessante, por exemplo, para o tratamento localizado da inflamação”, disse Vera Regina Leopoldo Constantino, professora do Instituto de Química (IQ) da USP e coordenadora do trabalho.

Como explicou a pesquisadora, partículas do tipo HDL podem ser encontradas na natureza ou sintetizadas em laboratório com alto grau de pureza, usando elementos presentes no organismo humano como zinco, magnésio e ferro – além de alumínio. As lamelas que formam o material possuem carga positiva e, para neutralizá-las, é necessário colocar entre elas uma espécie com carga negativa, como cloreto ou carbonato.

“O HDL formado por magnésio, alumínio e carbonato já é comercializado por um laboratório como um medicamento antiácido. A partir de 2001, começou a ser explorada na literatura científica a ideia de substituir o carbonato por um fármaco. Usar as lamelas para transportar esse fármaco dentro do organismo humano”, contou Constantino.

Vários estudos, relatou a pesquisadora, comprovaram que o fármaco fica mais protegido dentro das lamelas, o que pode ajudar a aumentar o tempo de prateleira do produto e promover uma liberação mais controlada do princípio ativo dentro do organismo, evitando picos que podem causar efeitos colaterais.

“Alguns estudos mostram ainda que, como as lamelas reduzem o processo de degradação do fármaco dentro do organismo, seria possível ao adotar esse carreador usar doses menores do princípio ativo, o que também contribui para a redução dos efeitos adversos. Antes de tudo, porém, é preciso comprovar que o material é biocompatível, ou seja, não vai induzir um processo inflamatório no organismo”, disse Constantino.

Neovascularização

Os experimentos em animais foram feitos por meio de uma colaboração com o grupo do professor Ivan Hong Jun Koh, da Escola Paulista de Medicina (EPM-Unifesp), cujo laboratório tem estudado a dinâmica circulatória dos microvasos – aqueles com diâmetro menor que 100 nanômetros.

Pastilhas de 5 milímetros (mm) de diâmetro e 2 mm de espessura contendo os HDLs sem nenhum tipo de fármaco foram implantadas no músculo abdominal de ratos adultos jovens e saudáveis. A região foi escolhida por ser altamente vascularizada e, caso ocorresse um processo inflamatório, seria fácil de detectá-lo.

Um grupo de animais recebeu HDL feito com magnésio, alumínio e cloreto e, outro, HDL de zinco, alumínio e cloreto. O processo de cicatrização foi acompanhado por 30 dias e comparado com o de outros dois grupos de animais: um controle negativo, submetido ao mesmo trauma cirúrgico, mas que não recebeu nenhum implante, e um controle positivo, no qual foi implantada uma tela de polipropileno – material reconhecidamente antigênico (capaz de induzir resposta inflamatória).

“Usamos uma abordagem inédita – a videomicroscopia SDF [Sidestream dark field] – para avaliar a capacidade de formação de novos vasos ao redor do implante. Esse dado é relevante porque, quando há inflamação, não se formam novos vasos sanguíneos e os microvasos já existentes passam a sofrer alterações na parede. Isso pode resultar na formação de trombos e na diminuição da densidade vascular local”, explicou o professor da Unifesp.

A metodologia, explicou Koh, permite avaliar tanto o número de vasos formados como suas características funcionais e estruturais, além da dinâmica do fluxo sanguíneo.

“Nos dois grupos de animais que receberam o implante de HDL a dinâmica circulatória foi tão boa quanto a do controle negativo. Notamos que o HDL feito com zinco estimulou mais do que o outro a neovascularização do tecido. Já no controle positivo observamos lesões vasculares”, contou Koh.

As análises histológicas mostraram que, enquanto no controle positivo houve ausência de reconstrução tecidual em decorrência da inflamação, nos dois grupos que receberam o HDL a resposta cicatricial ao final dos 30 dias foi ainda melhor que a observada no controle negativo. Segundo Koh, o resultado pode ser explicado pela presença dos metais zinco e magnésio, que são essenciais ao metabolismo celular e à estruturação de proteínas.

“O grupo que recebeu o HDL feito com zinco apresentou crescimento celular ainda mais acentuado e um tipo de colágeno diferente, mais frouxo, que o grupo submetido ao implante de HDL feito com magnésio. Isso é interessante, pois mostra que é possível controlar o tipo de proteína que será formado ao redor desse carreador de acordo com a necessidade de cada caso”, avaliou Koh.

Para o pesquisador, os resultados indicam um grande potencial de aplicabilidade dos HDLs como carreadores de fármacos e, até mesmo, como estimulantes de proliferação celular.

Próximas etapas

Os primeiros testes de biocompatibilidade dos implantes de HDL foram feitos em tecido muscular sadio. Segundo Constantino, atualmente estão sendo feitos novos experimentos nos quais as pastilhas implantadas contêm uma substância capaz de causar inflamação no tecido e também HDLs acoplados a um fármaco anti-inflamatório. Os resultados devem ser divulgados em breve.

O artigo “Accessing the biocompatibility of layered double hydroxide by intramuscular implantation: histological and microcirculation evaluation” pode ser lido em www.nature.com/articles/srep30547.
 

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