Pesquisa feita na Unifesp indica que polimorfismo em gene receptor da leptina modifica balanço energético e regulação neuroendócrina (foto: Walter Siegmund / Wikipedia)

Descoberta variação genética que dificulta emagrecimento em adolescentes obesos
20 de julho de 2018
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Pesquisa feita na Unifesp indica que polimorfismo em gene receptor da leptina modifica balanço energético e regulação neuroendócrina

Descoberta variação genética que dificulta emagrecimento em adolescentes obesos

Pesquisa feita na Unifesp indica que polimorfismo em gene receptor da leptina modifica balanço energético e regulação neuroendócrina

20 de julho de 2018
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Pesquisa feita na Unifesp indica que polimorfismo em gene receptor da leptina modifica balanço energético e regulação neuroendócrina (foto: Walter Siegmund / Wikipedia)

 

Maria Fernanda Ziegler  |  Agência FAPESP – Uma alteração em um gene que dificulta o processo de emagrecimento foi identificada em pesquisa feita na Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).

A pesquisa, feita com 76 adolescentes obesos entre 15 e 19 anos, mostrou que um polimorfismo no gene receptor da leptina – sinalizador da saciedade – altera de uma só vez a regulação neuroendócrina e o balanço energético.

Durante um ano, adolescentes pesando entre 101 e 120 quilos participaram de um programa de emagrecimento que incluiu atividade física e acompanhamento clínico, psicológico e nutricional por uma equipe multidisciplinar formada por médicos, nutricionistas, psicólogos, educadores físicos e fisioterapeutas. No entanto, enquanto metade dos adolescentes perdeu em média 10% do peso inicial, a outra perdeu 6%.

“Essa diferença nos intrigou. Não é que uma parte não obtivesse resultado – eles reduziram gordura visceral, corporal e tiveram melhoras nos exames bioquímicos –, mas não era possível que fosse apenas uma questão de maior ou menor empenho. Por isso, resolvemos estudar a parte genética”, disse Flávia Corgosinho, autora principal do estudo publicado na revista Neuropeptides.

O artigo é resultado do doutorado de Corgosinho, com bolsa da Capes, e do projeto de pesquisa de sua orientadora, a professora Ana Raimunda Dâmaso, da Unifesp, com apoio da FAPESP.

Com a investigação genética, os pesquisadores descobriram que os voluntários que respondiam de maneira inferior ao programa apresentavam uma determinada alteração no gene receptor da leptina (LEPR rs2767485).

O estudo analisou os efeitos de um polimorfismo dentro de um único gene entre os mais de 500 genes relacionados à obesidade. Corgosinho conta que a variação genética estudada é do tipo recessiva e que metade dos voluntários apresentava pelo menos um dos alelos com a alteração, uma mostra significativa dos adolescentes obesos da cidade de São Paulo.

“Como não tínhamos grupo controle no estudo, não podemos extrapolar esse dado para a população em geral”, disse Corgosinho à Agência FAPESP.

O estudo em adolescentes se mostra importante, sobretudo se for levado em conta que a dificuldade de emagrecimento aumenta com os anos de vida. “Na infância e na adolescência ocorre a aceleração do metabolismo devido à fase de crescimento. É uma ótima oportunidade de favorecer o emagrecimento e modificar hábitos não saudáveis. Fora isso, a chance de um adolescente obeso se tornar um adulto obeso é estimada em 80%”, disse Dâmaso.

Mais fome

O grupo de pesquisadores descobriu também que voluntários com a variação genética que dificultava o emagrecimento apresentavam níveis de neuropeptídeos da fome – neurotransmissores que regulam a saciedade – elevados, quando comparados ao outro grupo sem a variação genética.

“Moléculas sinalizadoras da fome, conhecidas como NPY, AgRP e o Hormônio Concentrador de Melanina (MCH), estavam mais elevadas naqueles que tinham alteração genética. Isso significa que teoricamente eles deveriam sentir mais fome”, disse Corgosinho.

O acompanhamento dos adolescentes mostrou que, com a terapia de emagrecimento, eles conseguiram reduzir o índice desses neuropeptídeos para valores similares àqueles que não tinham variação genética. Com os exames de sangue provou-se que existe uma tendência de regularização desses sinalizadores de fome, porém, um deles (AgRP) continuou a subir.

“Com isso, percebe-se que o grupo já começa a terapia com os sinalizadores da fome elevados. Há até uma melhora durante o programa, mas ainda existe dificuldade em regular esses neuropeptídios que ativam a fome. Não por acaso, o processo de emagrecimento deles fica mais complicado”, disse Corgosinho.

Nível excessivo de leptina

A leptina é um hormônio produzido e secretado principalmente pelo tecido adiposo que entre outras funções participa do controle neuroendócrino do balanço energético. Embora sua produção esteja diretamente relacionada à massa adiposa, é no hipotálamo (cérebro) que ela estimula neurônios e neuropeptídeos relacionados com a saciedade.

Estudo anteriores já haviam demonstrado que na obesidade em adolescentes, apesar de a leptina estar em altas concentrações (hiperleptinemia), ela tem efeito reduzido ou ineficaz, não há boa inibição da fome e concomitante aumento do gasto energético.

Corgosinho conta que existem alguns mecanismos propostos para que isso ocorra. “Um deles é que esse excesso de leptina poderia danificar o receptor. Outra hipótese é que o excesso de leptina superativaria o feedback negativo. O fato é que ainda não está bem estabelecido o que provoca essa resposta”, disse.

Embora teoricamente quanto mais leptina, mais saciedade e aumento na oxidação de gorduras, no obeso ocorre o contrário: ele produz leptina em demasia e esse excesso acaba gerando uma ineficiência no receptor. Isso pode levar a um quadro de resistência à ação desse hormônio (dificuldades de passar pela barreira hematoencefálica, impedindo sua ação).

“No estudo, percebemos que ambos os grupos de adolescentes obesos apresentavam hiperleptinemia, o que era esperado, porém apenas o grupo sem o polimorfismo conseguiu reduzir a leptina para valores normais depois do processo de emagrecimento”, disse Dâmaso à Agência FAPESP.

Com o emagrecimento, o esperado era reduzir a leptina para níveis normais e voltar a ter uma regulação do sistema neuroendócrino, mediado por esse hormônio, favorecendo tanto o aumento da saciedade quanto do gasto energético. “Com esse mecanismo ativo, a chance de voltar a engordar ou ter aquele efeito ioiô são menores. Há um controle maior sobre o apetite”, disse Dâmaso.

As pesquisadoras afirmam que o estudo também rendeu outros achados relacionados ao metabolismo lipídico e ao processo inflamatório – insulina, resistência insulínica e colesterol – que estão em vias de publicação.

“Pretendemos buscar estratégias para otimizar esse processo de emagrecimento. Identificamos a dificuldade e agora precisamos propor soluções. Talvez essa população precise de um alimento funcional para ter os mesmos benefícios, ou uma intensidade de exercício físico diferente da utilizada no programa para alcançar os mesmos resultados”, disse Corgosinho.

O artigo LEPR polymorphism may affect energy balance during weight loss among Brazilians obese adolescents (doi: 10.1016/j.npep.2017.07.007), de Flávia Campos Corgosinho, Sandro Soares Almeida, Lian Tock, João Bosco Pesquero, Ronaldo Carvalho Araújo, Ana Paula Grotti Clemente, Bárbara Dal'Molin Netto, Raquel Munhoz da Silveira Campos, Deborah Cristina Landi Masquio, Joana Pereira de Carvalho Ferreira, Priscila de Lima Sanches, Aline de Piano Ganen, Marcelo Macedo Rogero, Lila Missae Oyama, SergioTufik, Marco Túlio de Mello, Ana Raimunda Dâmaso, pode ser lido na Neuropeptides em https://doi.org/10.1016/j.npep.2017.07.007.
 

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