Desde o início do PPSUS em São Paulo, foram lançados cinco editais e apoiados mais de 300 projetos de pesquisa e bolsas sobre temas prioritários para a saúde. Conheça algumas das experiências mais bem-sucedidas (foto: Wikimedia Commons)

Em dez anos, R$ 32 milhões em pesquisas para o SUS
25 de fevereiro de 2016

Desde o início do PPSUS em São Paulo, foram lançados cinco editais e apoiados mais de 300 projetos de pesquisa e bolsas sobre temas prioritários para a saúde. Conheça algumas das experiências mais bem-sucedidas

Em dez anos, R$ 32 milhões em pesquisas para o SUS

Desde o início do PPSUS em São Paulo, foram lançados cinco editais e apoiados mais de 300 projetos de pesquisa e bolsas sobre temas prioritários para a saúde. Conheça algumas das experiências mais bem-sucedidas

25 de fevereiro de 2016

Desde o início do PPSUS em São Paulo, foram lançados cinco editais e apoiados mais de 300 projetos de pesquisa e bolsas sobre temas prioritários para a saúde. Conheça algumas das experiências mais bem-sucedidas (foto: Wikimedia Commons)

 

Karina Toledo | Agência FAPESP – Dez anos de existência, cinco editais lançados, mais de 300 projetos de auxílio à pesquisa e bolsas selecionados e R$ 32 milhões investidos no fomento da Ciência, Tecnologia e Inovação (CT&I). Esses são alguns números do Programa Pesquisa para o Sistema Único de Saúde (PPSUS) no Estado de São Paulo.

Algumas das experiências mais bem-sucedidas desenvolvidas com apoio da FAPESP no âmbito do PPSUS-SP foram apresentadas em um evento realizado no final de 2015, no Instituto de Saúde (IS), órgão vinculado à Secretaria do Estado da Saúde (SES-SP).

Uma delas foi a pesquisa coordenada por Eloisa Bonfá, professora da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP), que permitiu implantar entre 2007 e 2009, no Hospital das Clínicas (HCFMUSP), o Centro de Dispensação de Medicamentos de Alto Custo (Cedmac).

A iniciativa hoje se tornou uma rede, com unidades na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), na USP de Ribeirão Preto e na Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto (Famerp).

“Quando idealizamos o centro, estava começando no Brasil – particularmente na área de reumatologia – o uso de terapia biológica. São medicamentos caros, cujo uso ainda não estava bem padronizado no país. E existia uma forte pressão da indústria farmacêutica para que os médicos os receitassem”, contou Bonfá em entrevista à Agência FAPESP.

Indicada para pacientes que não respondem aos tratamentos tradicionais para doenças como artrite reumatoide, lúpus eritematoso sistêmico, espondilite anquilosante e artrite psoriásica, a terapia biológica é dirigida contra alvos específicos e ajuda a controlar a inflamação reproduzindo os efeitos de substâncias fabricadas naturalmente pelo organismo para regular a resposta imune. Pertencem a essa classe de fármacos, por exemplo, os anticorpos monoclonais inibidores do fator de necrose tumoral-alfa (TNFα).

A proposta inicial do centro era criar protocolos para o uso dessas medicações, em sua maioria endovenosas, sem que houvesse qualquer conflito de interesses com fabricantes. Na época, apenas um desses fármacos tinha o uso aprovado no Brasil. O tratamento de cada paciente custava ao SUS anualmente o equivalente ao preço de um carro sedã novo.

“Além de se dedicar à pesquisa e ao ensino, o centro também oferece assistência multidisciplinar aos pacientes. Eles são incluídos em protocolos de pesquisa e assinam uma autorização para a coleta dos dados. Passam por uma pré-consulta de enfermagem, depois são atendidos por um médico, ganham um cartão de identificação e, além do tratamento, têm o pronto atendimento garantido em caso de qualquer complicação”, contou a pesquisadora.

Segundo Bonfá, são comuns nesses casos a ocorrência de doenças oportunistas, que podem se manifestar de forma mais grave e disseminada, pois os medicamentos biológicos causam imunossupressão.

No primeiro ano, 130 pacientes foram assistidos no centro do HC. Em 2015, o número já passava de mil. O acompanhamento desses pacientes ao longo dos anos tem rendido diversos projetos de pesquisa, como, por exemplo, a criação e a validação de um protocolo para prevenir tuberculose em pessoas submetidas à terapia biológica.

Além da assistência prestada aos pacientes do Cedmac, a equipe também avalia presencialmente pacientes com doenças reumatológicas encaminhados pela SES, que em geral receberam prescrição de um medicamento não incorporado ao rol do SUS e entraram com processo administrativo para obter a droga.

“O objetivo é avaliar se a indicação do medicamento está adequada e principalmente se haveria outras opções de tratamento a serem prescritas inicialmente. No início, ocorreu uma resistência grande por parte dos reumatologistas, pois achavam que aquilo era uma interferência na prescrição médica. Quando começamos, cerca de 30% das prescrições poderiam ser substituídas por outras medicações com custo menor ou eram inadequadas. Hoje esse índice caiu para 15%. Todos entenderam que é preciso seguir um protocolo e estabelecer prioridades, pois o dinheiro do SUS não é infinito”, contou Bonfá.

Outra ação adotada pela equipe foi o compartilhamento de frascos das medicações endovenosas e a aplicação assistida de medicações subcutâneas. Como explicou Bonfá, a dose de alguns desses fármacos é calculada de acordo com o peso da pessoa. Se o paciente leva o medicamento para a casa, as sobras são descartadas. O Cedmac então criou uma agenda inteligente, de maneira que os pacientes submetidos a uma mesma terapia possam ser agendados em conjunto, possibilitando compartilhar doses e minimizar perdas. Todas essas ações permitiram uma economia de aproximadamente R$ 2,3 milhões apenas em 2015.

“É dinheiro público sendo revertido em benefício dos próprios pacientes, pois essa economia permite atender um número maior de pessoas”, avaliou Bonfá.

Qualidade de vida na gestação

Outra pesquisa com potencial para beneficiar mulheres atendidas no SUS e também na rede particular de saúde foi coordenada pelo epidemiologista Adriano Dias, professor do Departamento de Saúde Pública da Faculdade de Medicina de Botucatu (FMB), da Universidade Estadual Paulista (Unesp).

A equipe de Dias comprovou a efetividade de um protocolo simplificado de exercícios para o assoalho pélvico (músculos localizados na região entre as pernas, desde o osso púbico, na frente, até a base da espinha, nas costas) na prevenção de incontinência urinária durante e após a gravidez. O método testado em 87 voluntárias foi divulgado em artigo publicado na Revista Brasileira de Ginecologia e Obstetrícia em 2015.

De acordo com o pesquisador, a incontinência urinária afeta cerca de 40% das gestantes, mas ainda é uma queixa subvalorizada pelos profissionais de saúde, pois é vista como algo “normal” nesse momento da vida.

“Nossa ideia era testar exercícios muito simples – basicamente contrair e relaxar os músculos da região –, que as mulheres pudessem fazer sozinhas, em apenas cinco minutos, sem alterar sua rotina e sem a necessidade de ir a uma clínica ou academia. Apenas em um primeiro momento, seriam instruídas por um fisioterapeuta”, explicou Dias.

Os resultados foram surpreendentes: 100% das voluntárias que desenvolveram incontinência durante a gestação e praticaram os exercícios nos meses seguintes conseguiram se livrar do incômodo antes do parto – e assim permaneceram nos dois anos seguintes, período em que foram acompanhadas.

Já no grupo das gestantes que tiveram incontinência e não praticaram o método, 50% mantiveram a queixa ao final dos dois anos de seguimento. Os resultados da pesquisa devem ser publicados em breve. 

Definindo prioridades

Criado com o objetivo de descentralizar as atividades de fomento federal à CT&I e, ao mesmo tempo, financiar pesquisas em temas prioritários para a saúde da população brasileira, reduzindo desigualdades regionais, o programa PPSUS é coordenado em âmbito nacional pelo Ministério da Saúde, por meio do Departamento de Ciência e Tecnologia da Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos (Decit/SCTIE).

São parceiros da iniciativa o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e, nos diversos estados da federação, as Fundações de Amparo à Pesquisa (FAPs), as Secretarias Estaduais de Saúde e as Secretarias de Ciência e Tecnologia. No Estado de São Paulo, o Instituto de Saúde representa a SES-SP no Comitê Gestor do PPSUS.

“A FAPESP, em parceria com o CNPq, tem financiado projetos desde o início do programa em São Paulo. Nesses dez anos, já selecionou mais de 300 propostas, que receberam ao todo R$ 32 milhões. Tem sido uma iniciativa bem-sucedida na consolidação da pesquisa em políticas públicas na área de saúde”, avaliou Simone Godoi, Gerente de Área Científica – Ciências da Saúde da Fundação.

Segundo Maritsa Carla de Bortoli, diretora do Núcleo de Fomento e Gestão de Tecnologias da Saúde do Instituto de Saúde, o PPSUS propiciou, ao longo dos últimos dez anos, o desenvolvimento de parcerias entre instâncias de saúde, ciência e tecnologia federais e estaduais.

“Além desses parceiros, envolve pesquisadores, profissionais de saúde, gestores de saúde, representantes de áreas técnicas das secretarias de saúde estadual e municipais e da sociedade civil. É uma ferramenta importante de diálogo, parcerias e desenvolvimento de projetos entre áreas, como academia e gestão, que normalmente trabalham separadamente e, nos editais, se unem para tentar solucionar os principais problemas de saúde da população, descritos nas linhas prioritárias de investigação”, acrescentou.

A definição dos temas prioritários é um dos pontos cruciais para o sucesso do programa. Para isso, o Instituto de Saúde costuma organizar, antes de cada edital, uma Oficina de Definição de Prioridades de Pesquisa. A última oficina ocorreu em agosto de 2015. Segundo Bortoli, os temas definidos nos grupos de trabalho comporão o próximo edital do PPSUS, que provavelmente será lançado em 2016 com três grandes eixos: “Redução da morbimortalidade por doenças e agravos prioritários no Estado de São Paulo”, “Gestão de sistemas de saúde” e “Tecnologia e inovação no SUS”.

“O processo de seleção de temas vem sendo aperfeiçoado, assim como as estratégias para promover a incorporação dos resultados das pesquisas apoiadas ao sistema de saúde”, disse Bortoli.

O grau de dificuldade para a incorporação, segundo Bortoli, varia de acordo com o perfil do projeto e depende de fatores como o âmbito da pesquisa (municipal, regional, estadual e até nacional), o tipo de parceria estabelecida entre pesquisadores e gestores e o próprio objetivo proposto.

“Infelizmente, algumas boas ideias acabam não seguindo adiante por diversos fatores que escapam à alçada do PPSUS e da SES-SP. Muitas vezes isso está relacionado com as parcerias, com a solidez das empresas que participam dos projetos ou dificuldades no patenteamento dos produtos gerados pelas pesquisas”, contou Bortoli.

Um exemplo é o caso da pesquisa coordenada entre 2007 e 2009 por Mário Bracco, pesquisador do Instituto Israelita de Ensino e Pesquisa Albert Einstein.

O estudo comprovou a eficácia de uma tecnologia desenvolvida no Brasil – o homoglobinômetro HB-010 (Leia mais em: revistapesquisa.fapesp.br/2008/09/01/resposta-rapida/?cat=pesquisa-inovativa-em-pequenas-empresas) – para diagnosticar casos de anemia causados por deficiência de ferro.

Mostrou ainda que, por ser capaz de fazer o diagnóstico em apenas cinco minutos, com uma gota de sangue e baixo custo, o equipamento poderia ser um importante aliado no tratamento da doença – considerada um problema de saúde pública no Brasil. Em estudos com crianças feitos em três regiões do país, as taxas de recuperação chegaram a 80%, bem mais altas que a média do SUS. Os dados foram publicados no Jornal de Pediatria.

No entanto, a empresa desenvolvedora ainda não conseguiu se viabilizar economicamente no mercado e a tecnologia não foi incorporada ao sistema de saúde.

Na avaliação de Bortoli, porém, nenhum resultado de pesquisa pode ser considerado como não aproveitável. “Ainda que não possa ser adotado imediatamente no sistema de saúde, certamente tem seu papel gerando conhecimento, participando da formação de recursos humanos, desenvolvendo ou fortalecendo grupos e linhas de pesquisa”, avaliou.

Ela afirmou que o Comitê Gestor do Programa vem lançando mão de estratégias para promover cada vez mais a incorporação dos resultados, como a inclusão do Seminário Marco Zero no calendário regular de atividades dos projetos apoiados. No encontro, os coordenadores, logo após sua contratação, são convidados a apresentar seus projetos para gestores e representantes de áreas técnicas da SES-SP. A ideia é criar parcerias e levar ao conhecimento dos gestores os projetos que, no período de dois anos, poderão trazer informações importantes para uma determinada área técnica.

“Nossa intenção é desenvolver um estudo para avaliar a implantação do PPSUS-SP e, possivelmente, teremos como um dos indicadores a incorporação dos resultados. Também já temos um veículo on-line que traz alguns resultados importantes alcançados nas três primeiras edições do programa, que é a revista Experiências Exitosas PPSUS-SP acessível em https://madmagz.com/magazine/614158”, ressaltou.

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